O método “ver, julgar e agir” completa 56 anos e nunca foi tão importante





Em tempos conturbados como os de agora, é necessário ter cautela em nossas avaliações pessoais e políticas

Devaldo Gilini Junior
Jornalista

O mês de maio marcou o 56º aniversário da adoção por parte da Igreja do método “Ver, Julgar e Agir”, como parte do ensino e prática sociais católicos. O Papa João XXIII reconheceu formalmente o método em sua encíclica Mater et Magistra publicada no dia 15 de maio de 1961. Foi o falecido cardeal Joseph Cardijn, fundador do movimento da Juventude Operária Cristã (JOC), que sugeriu ao Papa que publicasse uma encíclica para marcar o 70º aniversário da histórica encíclica Rerum Novarum do Papa Leão XIII.
Em resposta, João XXIII pediu que Cardijn providenciasse um esboço das questões a serem abordadas na encíclica. Ele fez isso em um memorando de 20 páginas apresentado ao pontífice.
Quando a Mater et Magistra apareceu pouco mais de um ano depois, a encíclica observava que, “para levar a realizações concretas os princípios e as diretrizes sociais, passa-se ordinariamente por três fases” (n. 235). Primeiro, o “estudo da situação” concreta, escreveu o Papa. Em segundo lugar, a “apreciação da mesma à luz desses princípios e diretrizes”. Em terceiro, o “exame e determinação do que se pode e deve fazer para aplicar os princípios e as diretrizes à prática”.
Esses “são os três momentos que habitualmente se exprimem com as palavras seguintes: “Ver, Julgar e Agir”, continuava a encíclica.
Desde então, o método foi reconhecido e adotado por toda a Igreja, mas foi popularizado na América Latina, principalmente nos anos 1950, pela Conferência dos Bispos na América Latina e Caribe e entre as pastorais populares. Hoje é o método mais utilizado pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) para os seus trabalhos pastorais. Consiste em um método prático de formação na ação, que nos tira do comodismo, nos levando a assumir compromissos na transformação da sociedade.
O método está ligado à maneira de ser Igreja, e ajuda no processo de pastoral de conjunto, fazendo Ver “como comunidade”, Julgar “como comunidade” e Agir “como comunidade”. A Igreja, sem se preocupar com suspeitas alarmistas valeu-se do método para expressar sua prática de fé, especificar sua missão e fazer uma profunda reflexão teológica. Isso demonstra que o método faz Ver com os olhos do Pai; Julgar coerentemente segundo os ensinamentos e exemplos do Filho e da comunidade; e Agir sob a influência do Espírito Santo. 
Este método ajuda a situar-se diante da realidade concreta; a confrontar a realidade com a Palavra de Deus; a encaminhar uma ação transformadora para melhorar, corrigir e até transformar uma realidade; a avaliar a caminhada e o engajamento de um grupo ou vários grupos; e a celebrar liturgicamente essa realidade.
Na Pastoral, esse método parte das reais necessidades das pessoas; clareia o conteúdo que se transmite; permite vincular a teoria à prática; envolve as pessoas, exigindo a participação nos encontros; dá vida e significado ao conteúdo (doutrina); alegra o ambiente, provocando a participação de todos; desenvolve a capacidade de observação e compromisso; ajuda a diminuir os gastos, o tempo e a aproveitar melhor os recursos; estimula a criatividade, o trabalho grupal e a corresponsabilidade; dá mais segurança diante dos desafios e barreiras; e evita a improvisação.
Mas é importante ressaltar que as etapas deste processo não acontecem separadamente. Uma etapa depende da outra para acontecer.
VER – A realidade humana é complexa, é um mistério que não acabamos de conhecê-la nunca, por isso convém aproximar-se dela com respeito, lembrando que a dignidade humana é o mais importante; o olhar crítico deve discernir as forças de vida e de morte que atuam na realidade observada. Mas não se trata de observar a realidade de modo passivo, trata-se de mergulhar na realidade, ou seja, inserir-se, encarnar-se, tendo como modelo Jesus Cristo, que encarnou-se, assumindo assim a vida humana, viveu a vida dos seres humanos sendo Deus, assumiu as nossas fraquezas, limitações e problemas, ajudando-nos a superá-las.
JULGAR – Tem o sentido de iluminar, criticar, de confrontar a realidade à luz da ótica cristã, exigindo fidelidade a Deus e aos irmãos. Trata-se de analisar as causas e consequências dos fatos observados; questionar criticamente o que se vê; discernir o que está a serviço da vida ou da morte. Mas se exige três importantes critérios para se Julgar de modo coerente: um bom conhecimento da realidade humana e social (ver); discernimento crítico à luz da fé; e intimidade com a Palavra de Deus (também uma leitura contextualizada, e não fundamentalista).
São também critérios importantes para a formação de opinião do Julgar um bom conhecimento da doutrina da Igreja, a escuta da Palavra de Deus que se revela no hoje dos acontecimentos da história (espiritualidade e mística), humildade (estar sempre disposto a aprender algo novo), capacidade de superar preconceitos e mudar de opinião, e reconhecer que não estamos sempre certos, estamos sempre nos aproximando da verdade, não somos donos dela.
De forma resumida, são três os pontos de apoio para uma boa formação de opinião sobre o Julgar: o bom senso, a Palavra de Deus na Bíblia e a Doutrina da Igreja.
AGIR – É o momento de encaminhar uma ação transformadora da realidade constatada e crítica da realidade ou situação. Quando falamos de Agir não se fala somente de fazer coisas, mas estamos falando de uma mudança de atitude diante da vida, ou seja, uma transformação pessoal e integral, atingindo todos os níveis da pessoa, causando consequências diretas e indiretas na sociedade, comprometendo não só os indivíduos isolados da sociedade, mas toda a comunidade eclesial.
O PÓS – O momento “pós” da metodologia vem a ser o Rever e Celebrar. O primeiro é um avaliar ou tomar consciência hoje do que fizemos ontem para melhorar o agir de amanhã. Essa é a etapa mais importante do método. E como cristãos, a Fé e a Vida são integradas, não se separam por isso o Celebrar, celebramos nossas vitórias conquistadas, fracassos, alegrias e tristezas, e nossa organização. Pois é celebrando a vida concreta que reconhecemos a presença do Deus libertador em nossa caminhada.
MOMENTO ATUAL – Diante do momento conturbado em que estamos a viver, não somente no Brasil, mas em todo o mundo, é preciso que os católicos se utilizem do método “Ver, Julgar e Agir” para conseguirem formar uma opinião mais apurada de tudo o que está a acontecer, na vida pessoal e no dia a dia, levando-se em conta que todos os atos que praticamos têm ações políticas.
A CNBB é uma boa referência e, ultimamente, vem divulgando várias notas sobre o momento atual vivido por nós brasileiros. Recentemente, no dia 19 do mês passado, divulgou a nota “Pela Ética na Política”, na qual faz uma análise sucinta das mais recentes denúncias. “Tais denúncias exigem rigorosa apuração, obedecendo-se sempre as garantias constitucionais. Apurados os fatos, os autores dos atos ilícitos devem ser responsabilizados”, diz trecho da nota.
Os bispos afirmam também ser importante a participação da sociedade na elucidação dos fatos. “A vigilância e a participação política das nossas comunidades, dos movimentos sociais e da sociedade, como um todo, muito podem contribuir para elucidação dos fatos e defesa da ética, da justiça e do bem comum”, reforça outro trecho da nota.
Aliás, a entidade máxima da igreja católica brasileira vem se posicionando de forma progressista em diversos assuntos da política nacional. Os bispos se colocam contra as reformas trabalhista e previdenciária do governo federal. “O debate sobre a Previdência e o Trabalho não pode ficar restrito a uma disputa ideológico-partidária, sujeito a influências de grupos dos mais diversos interesses. Quando isso acontece, quem perde sempre é a verdade. O diálogo sincero e fundamentado entre governo e sociedade deve ser buscado até a exaustão”, afirmam os representantes do episcopado brasileiro.
Sobre o momento atual, a nota da entidade usa a citação do Papa Francisco, onde o sumo pontífice afirma que “na vida pública, na política, se não houver a ética, uma ética de referimento, tudo é possível e tudo se pode fazer”. Por isso, dizem os bispos brasileiros, “é necessário que saídas para a atual crise respeitem e fortaleçam o Estado democrático de direito”. A CNBB mais uma vez traz uma visão lúcida e clara em favor da democracia e do respeito ao povo brasileiro.
Nós também temos que procurar informações, não só nas redes sociais (Facebook) ou sites que são partidários deste ou daquele setor, que na grande maioria das vezes só espalham mentiras que são compartilhadas por aquelas pessoas que não se dão nem ao trabalho de verificar a veracidade das notícias.
Precisamos analisar os fatos com responsabilidade e serenidade. Procurar fontes de informação que são mais confiáveis como aquelas que fazem parte da estrutura da nossa Igreja. É preciso ver com os olhos e mentes abertos, julgar com senso de justiça, e agir de forma a dar valor à ética acima de tudo. Não podemos ficar calados diante das denúncias de corrupção que atingem a todos os partidos e à grande maioria dos políticos.
Tem gente mais preocupada com a maneira que a economia vai reagir, sem se importar muito com o “modus operandi” da classe política, que rouba o dinheiro público na cara dura, apostando na impunidade ou na demora da Justiça em julgar os casos. A ética deve valer para todos, mas alguns preferem fechar os olhos desde que seus negócios estejam indo bem.
Neste momento use, sem restrições, o método “Ver, Julgar e Agir”.
Saúde e Paz.

FONTE BIBLIOGRÁFICA:


DONZELLINI, Mary (Coord.). O método ver-julgar-agir-rever-celebrar. Metodologia fé e vida caminham juntas em comunidade: subsídio de reflexão para a formação dos catequistas. 2. ed. São Paulo: PAULUS, 1998. (Caderno Catequético, v.9)

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